O Papa Francisco, na Bula de
Proclamação do Jubileu Extraordinário da Misericórdia, Misericordiae Vultus, faz insistentes pedidos a que abramos nosso
coração numa acolhida repleta de amor e de compreensão para com todos. “Que a
palavra do perdão possa chegar a todos e a chamada para experimentar a
misericórdia não deixe ninguém indiferente”, conclama o Pontífice.
A proposta é ousada. O Papa chega
a propor abertamente aos criminosos que se arrependam de seus delitos e voltem
a uma vida honrada: “Penso de modo particular nos homens e mulheres que
pertencem a um grupo criminoso, seja ele qual for. Para vosso bem, peço-vos que
mudeis de vida. Peço-vo-lo em nome do Filho de Deus que, embora combatendo o
pecado, nunca rejeitou qualquer pecador. Não caiais na terrível cilada de
pensar que a vida depende do dinheiro e que, à vista dele, tudo o mais se torna
desprovido de valor e dignidade. Não passa de uma ilusão. Não levamos o
dinheiro conosco para o além. O dinheiro não nos dá a verdadeira felicidade. A
violência usada para acumular dinheiro que transuda sangue não nos torna
poderosos nem imortais”.
Em seguida, deseja que “o mesmo
convite chegue também às pessoas fautoras ou cúmplices de corrupção”. Não
deixa, porém, de apontar as nefastas consequências que esse câncer produz na
vida de muitas pessoas. Diz o Papa: “Esta praga putrefata da sociedade é um
pecado grave que brada aos céus, porque mina as próprias bases da vida pessoal
e social. A corrupção impede de olhar para o futuro com esperança, porque, com
a sua prepotência e avidez, destrói os projetos dos fracos e esmaga os mais
pobres. É um mal que se esconde nos gestos diários para se estender depois aos
escândalos públicos. A corrupção é uma contumácia no pecado, que pretende
substituir Deus com a ilusão do dinheiro como forma de poder. É uma obra das
trevas, alimentada pela suspeita e a intriga. Corruptio optimi pessima: dizia, com razão, São Gregório Magno,
querendo indicar que ninguém pode sentir-se imune desta tentação. Para a
erradicar da vida pessoal e social são necessárias prudência, vigilância,
lealdade, transparência, juntamente com a coragem da denúncia. Se não se
combate abertamente, mais cedo ou mais tarde torna-nos cúmplices e destrói-nos
a vida”.
Quando ouvimos falar de corrupção
vêm-nos à mente apenas os políticos, como se esse mal fosse exclusivo de um
determinado grupo de pessoas. No entanto, não é assim. Todos devemos estar atentos
para não escorregarmos em pequenas concessões que, com o tempo, acabam por nos
afundar num lamaçal pegajoso e difícil de sair. No começo, pensa-se que receber
um pequeno agrado para privilegiar alguém, desde que não prejudique a ninguém, não
fará mal. Em seguida, o “presente” não será mais tão pequeno assim, como também
se ganha uma insensibilidade com o prejuízo que possa causar a outras pessoas,
“afinal, todo mundo faz isso”, diz-se como desculpa para anestesiar a
consciência. Com isso, de pequenos “favorzinhos” podemos nos perder num
emaranhado de negócios escusos dos quais é muito difícil de se livrar.
É tempo de darmos um basta na
corrupção que amordaça o nosso País, impedindo-nos de olhar para o futuro com
esperança, como diz o Papa. Nessa luta, porém, comecemos por nós mesmos. Se
queremos exigir dos demais uma postura ética e honrada, temos de nos examinarmos
a nós próprios e cortar toda e qualquer conduta que não seja absolutamente
íntegra e correta. Afinal, não há meio corrupto, como ademais não há ninguém meio
honesto. Honestidade, honra e integridade são atributos que se têm ou não se
têm. Pouco importa a um pássaro estar preso a uma linha ou a um espesso cabo de
aço. Ambos igualmente impedem-no de voar. Também não há tanta diferença como
parece reter maliciosamente o troco devido a alguém ou desviar milhões. É claro
que esse é bem mais grave que aquele pelo dano que causa aos demais. Ambos,
porém, impedem-nos de nos movermos nesse mundo com a tranquilidade de espírito
que somente os de intenção reta e os puros de coração podem experimentar.
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