segunda-feira, 2 de março de 2015

A Imparcialidade do Juiz

Muito se tem debatido recentemente nos meios de comunicação sobre a imparcialidade do magistrado, com atenção maior quando se trata dos Ministros do Supremo Tribunal Federal. É que, como se sabe, são eles nomeados pelo Presidente da República, após aprovação pelo Senado Federal.
Lembro-me agora de uma pergunta que fiz ao professor Cândido Dinamarco quando ainda estávamos nos bancos da faculdade: “Professor, se é o Presidente quem indica os Ministros do Supremo, como poderão eles julgar com isenção as causas em que o governo tem interesse ou mesmo os crimes eventualmente praticados pelo Presidente?”. Não me recordo exatamente das suas palavras, mas o que respondeu foi que há uma espécie de efeito (ou fenômeno) da toga, que assegura a imparcialidade mesmo em relação a quem o nomeou. Até porque – dizia ele – o chefe do Poder Executivo nomeia, mas não pode retirar o magistrado do cargo, que é vitalício.

Confesso que não fiquei muito convencido disso. Porém, posteriormente, as experiências confirmaram o acerto do mestre. Após a formatura, alguns colegas ingressaram na magistratura e então pude notar que, em geral, mantinham o mesmo tom amistoso no relacionamento. Porém, se fosse necessário tratar de algum caso que ele (ou ela) haveria de julgar, assumiam naturalmente uma postura reservada, como que dizendo sem palavras: “nesse assunto não quero estar atado a nada, nem à nossa amizade, mas apenas ao que determina a Lei e a minha consciência”.
É curioso notar como o cargo ou a profissão vai aos poucos mudando o modo de ser e de agir das pessoas. Certa vez um empresário que muito admiro contou uma experiência vivenciada como Síndico do seu condomínio. Dizia ele que havia dois rapazes, moradores do prédio, que causavam sérios transtornos aos vizinhos. E eis que em uma conversa que teve com eles, resolveu “nomeá-los” seus assessores para assuntos de segurança. E foi incrível notar que, com a responsabilidade que assumiram, mudaram radicalmente o comportamento.
É claro que isso funciona com pessoas honradas, que receberam e cultuam bons valores. É que não há toga que faça milagres ou mesmo função de responsabilidade que corrija indivíduos de má índole, desonestos, usurpadores etc.
Em geral, porém, um magistrado prudente consegue manter a devida equidistância das partes em litígio e, com isso, proferir julgamentos imparciais. No entanto, isso exige cautelas. E quando há uma ligação do magistrado com as partes, há também um expediente legal para que o juiz não julgue aquele caso para o qual for suspeito ou estiver impedido.
Mas há um aspecto que deve merecer atenção especial. É que há situações em que o magistrado consegue manter a imparcialidade para julgar, não se sente subjetivamente comprometido com nenhuma das partes, nem se enquadra tampouco nas situações em que a Lei aponta como suspeição ou impedimento. Porém, dadas as circunstâncias, pode ocorrer (desconfortável) suspeita entre os envolvidos ou mesmo em toda a coletividade acerca da sua imparcialidade. Nesse caso, em regra, convém que o próprio magistrado se dê por suspeito e não participe do julgamento.
E tudo isso que temos dito vale com maior razão aos integrantes dos chamados Tribunais Superiores. Tal como acontece numa família, os desvios e escândalos causados pelos pais nem sempre fazem com que os filhos se percam, mas é muito duro para esses conviver tais maus exemplos. Algo de semelhante acontece na magistratura. Alguma conduta inadequada daqueles que ocupam as suas altas instâncias não macula todos os seus membros, mas esses por certo se sentirão menos estimulados a continuar lutando para cumprir honradamente a sua missão. Além disso, experimentam as amargas consequências de integrar uma instituição cuja imagem venha a ser ferida por aqueles que estão na sua cúpula.


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