Muito se tem
debatido recentemente nos meios de comunicação sobre a imparcialidade do
magistrado, com atenção maior quando se trata dos Ministros do Supremo Tribunal
Federal. É que, como se sabe, são eles nomeados pelo Presidente da República,
após aprovação pelo Senado Federal.
Lembro-me agora de
uma pergunta que fiz ao professor Cândido Dinamarco quando ainda estávamos nos
bancos da faculdade: “Professor, se é o Presidente quem indica os Ministros do
Supremo, como poderão eles julgar com isenção as causas em que o governo tem
interesse ou mesmo os crimes eventualmente praticados pelo Presidente?”. Não me
recordo exatamente das suas palavras, mas o que respondeu foi que há uma
espécie de efeito (ou fenômeno) da toga, que assegura a imparcialidade mesmo em
relação a quem o nomeou. Até porque – dizia ele – o chefe do Poder Executivo
nomeia, mas não pode retirar o magistrado do cargo, que é vitalício.
Confesso que não
fiquei muito convencido disso. Porém, posteriormente, as experiências
confirmaram o acerto do mestre. Após a formatura, alguns colegas ingressaram na
magistratura e então pude notar que, em geral, mantinham o mesmo tom amistoso
no relacionamento. Porém, se fosse necessário tratar de algum caso que ele (ou
ela) haveria de julgar, assumiam naturalmente uma postura reservada, como que
dizendo sem palavras: “nesse assunto não quero estar atado a nada, nem à nossa
amizade, mas apenas ao que determina a Lei e a minha consciência”.
É curioso notar
como o cargo ou a profissão vai aos poucos mudando o modo de ser e de agir das
pessoas. Certa vez um empresário que muito admiro contou uma experiência
vivenciada como Síndico do seu condomínio. Dizia ele que havia dois rapazes,
moradores do prédio, que causavam sérios transtornos aos vizinhos. E eis que em
uma conversa que teve com eles, resolveu “nomeá-los” seus assessores para
assuntos de segurança. E foi incrível notar que, com a responsabilidade que
assumiram, mudaram radicalmente o comportamento.
É claro que isso
funciona com pessoas honradas, que receberam e cultuam bons valores. É que não
há toga que faça milagres ou mesmo função de responsabilidade que corrija
indivíduos de má índole, desonestos, usurpadores etc.
Em geral, porém,
um magistrado prudente consegue manter a devida equidistância das partes em
litígio e, com isso, proferir julgamentos imparciais. No entanto, isso exige
cautelas. E quando há uma ligação do magistrado com as partes, há também um
expediente legal para que o juiz não julgue aquele caso para o qual for
suspeito ou estiver impedido.
Mas há um
aspecto que deve merecer atenção especial. É que há situações em que o
magistrado consegue manter a imparcialidade para julgar, não se sente
subjetivamente comprometido com nenhuma das partes, nem se enquadra tampouco nas
situações em que a Lei aponta como suspeição ou impedimento. Porém, dadas as
circunstâncias, pode ocorrer (desconfortável) suspeita entre os envolvidos ou
mesmo em toda a coletividade acerca da sua imparcialidade. Nesse caso, em
regra, convém que o próprio magistrado se dê por suspeito e não participe do
julgamento.
E tudo isso que
temos dito vale com maior razão aos integrantes dos chamados Tribunais
Superiores. Tal como acontece numa família, os desvios e escândalos causados
pelos pais nem sempre fazem com que os filhos se percam, mas é muito duro para
esses conviver tais maus exemplos. Algo de semelhante acontece na magistratura.
Alguma conduta inadequada daqueles que ocupam as suas altas instâncias não macula
todos os seus membros, mas esses por certo se sentirão menos estimulados a
continuar lutando para cumprir honradamente a sua missão. Além disso, experimentam
as amargas consequências de integrar uma instituição cuja imagem venha a ser
ferida por aqueles que estão na sua cúpula.
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