segunda-feira, 1 de abril de 2013

A ecologia humana

Enquanto pensava num tema para compartilhar com o leitor nesta coluna, resolvi, despretensiosamente, indagar à minha filha, de seis anos, sobre o que escrever. Ao fazer a pergunta, ela respondeu imediatamente: “escreva que devemos cuidar do planeta”. Confesso que fiquei feliz com a resposta, afinal, ao menos em teoria, a questão ecológica tem sido bem trabalhada desde cedo nas escolas.
Mas resolvi insistir um pouco mais no assunto e então perguntei: “Filha, mas o que devemos fazer para cuidar do planeta?”. E então ela respondeu com ares de quem dizia o óbvio: “Cuidar das plantas, dos animais...”. E, depois de uma pausa, prosseguiu: “Mas precisamos cuidar das pessoas também...”.
Penso que apesar da simplicidade, a frase – tão ao estilo das crianças – é ao mesmo tempo muito sábia e bem merece a nossa reflexão. A propósito, o Papa Bento XVI, no seu célebre discurso no Parlamento Alemão, aborda com profundidade o mesmo tema:
“A importância da ecologia é agora indiscutível. Devemos ouvir a linguagem da natureza e responder-lhe coerentemente. Mas quero ainda enfrentar decididamente um ponto que, hoje como ontem, é largamente descurado: existe também uma ecologia do homem. Também o homem possui uma natureza, que deve respeitar e não pode manipular como lhe apetece.
“O homem não é apenas uma liberdade que se cria por si própria. O homem não se cria a si mesmo. Ele é espírito e vontade, mas é também natureza, e a sua vontade é justa quando ele escuta a natureza, respeita-a e quando se aceita a si mesmo por aquilo que é e que não se criou por si mesmo. Assim mesmo, e só assim, é que se realiza a verdadeira liberdade humana”.
Quando um cientista se põe a estudar os seres vivos e também os demais elementos de um ecossistema, como o solo, rios etc., costuma ficar deslumbrado com a perfeição do funcionamento da cada parte dentro do todo. Com isso, chega-se sem esforço à conclusão de que a natureza possui as suas leis de funcionamento. Em suma, as coisas são como são e a ação ordenada dessas leis naturais dá-lhes o equilíbrio e a harmonia.
Mas se isso é universalmente aceito em relação à ecologia, o mesmo não ocorre com o ser humano. Pensa-se que a mulher e o homem podem moldar o seu ser livremente e sem limites. São sintomas disso as cirurgias para mudança de sexo ou as técnicas de reprodução assistida, em que os pais escolhem o sexo e até a cor dos olhos dos filhos que terão.
Esse fenômeno não se limita ao aspecto físico. No relacionamento com os demais também há questões que tocam na própria natureza humana, mas que modernamente se busca negar ou relativizar. Tomemos como exemplo o matrimônio, que é uma instituição natural e não uma mera convenção social, fundado na diversidade de sexo entre os contraentes e que, precisamente por serem diferentes, podem-se complementar um ao outro numa comunhão plena de vida que, por ser fruto e fonte do amor, é fecundo, formando um habitat essencial para gerar e formar novos seres humanos.
Por que será que em nosso tempo se fala tanto em defesa da ecologia, reconhecendo nisso que a natureza tem leis próprias que tendem à preservação das espécies e dos ecossistemas, mas se nega a existência de uma natureza humana, também com suas leis que orientam não apenas ao equilíbrio natural, mas também à sua realização e pleno desenvolvimento da sua personalidade?

Confesso ao leitor que não tenho a resposta. Talvez seja um daqueles grandes erros que a história saberá apontar. Mas é necessário e é urgente defendermos com coragem e determinação que há uma ecologia do ser humano também a ser preservada. Afinal, não seria um contrassenso pretendermos que mulheres e homens “ecologicamente desequilibrados” em si mesmos se dispusessem a preservar o equilíbrio na natureza que os circunda?

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