Em
recente decisão, o Superior Tribunal de Justiça reconheceu o direito à
indenização de uma filha em relação ao seu pai por abandono afetivo. Trata-se
de uma decisão histórica que merece especial atenção, especialmente pelos rumos
que podem estar tomando as relações familiares em nossa sociedade.
Todo
filho tem o direito natural de ser cuidado e educado por seus pais. Com efeito,
a paternidade não se encerra no ato de gerar. Assim como o pai coopera no ato
de dar a vida a um novo ser, incumbe-lhe, com absoluta prioridade, o dever de
cuidar e educar a prole.
Além
disso, todo ser humano foi concebido para nascer, desenvolver-se e morrer no
seio de uma família. A família é como que o habitat
natural do homem e da mulher. Nesse sentido, o cuidado e a educação dos
filhos devem ser proporcionados no convívio diário, em grande parte no seio do
próprio lar.
Quem já
teve a fantástica experiência de exercer a paternidade sabe que todos os
momentos e circunstâncias da vida familiar são oportunidades educativas. Os
filhos aprendem muito mais com o exemplo do que com os que os pais os lhes dizem.
Além disso, é na convivência diária que se pode desenvolver o espírito de
observação de modo a orientar, aconselhar, corrigir e estimular os nossos
filhos.
Atento
a esses dados, que tocam na própria natureza do ser humano, convém agora nos
debruçarmos sobre o alcance que poderá ter a recente decisão, como também de
outras que a poderão suceder a partir desse precedente.
Justiça
não é simplesmente o resultado que se espera de uma decisão judicial. De fato, convém
que essas sejam, acima de tudo, justas. Porém, muito mais que isso, justiça é
uma virtude humana, que nos move a dar a cada um o que lhe é devido. Nesse
sentido, é justo o pai que se desdobra para cuidar e educar os filhos todos os
dias. O pagamento de uma indenização por danos morais é, portanto, um
paliativo, uma punição que se impõe aos pais negligentes no respeito aos
direitos dos filhos, e não o cumprimento de um preceito de justiça.
Nesse
momento, cabe-nos, portanto, indagar: será necessário, doravante, impor
punições aos pais que negligenciam no cuidado e educação dos filhos?
Lembro-me
de um bom professor que tive nos primeiros anos da Faculdade de Direito. Numa
aula ele se empenhava em traçar as diferenças entre o direito e as meras regras
de convivência social. E dizia que essas, por vezes, podem se converter em
normas jurídicas. E deu o seguinte exemplo: antigamente, quando uma pessoa
idosa adentrava no bonde, imediatamente alguém lhe cedia o lugar. Com o tempo,
tornou-se necessário editar normas, reservando assentos para essas pessoas nos
meios de transporte públicos, pois não mais era possível contar apenas com a
cortesia dos mais jovens.
Há quem
diga que a recente decisão do STJ permite traçar um paralelo com a situação do
respeito ao idoso. Ou seja, que antigamente os pais zelavam para criação e
educação dos filhos independentemente do risco de uma condenação judicial; no
momento atual, porém, faz-se necessária a possibilidade da punição. Não creio
que a comparação seja de todo justa. Afinal, sempre existiram pais negligentes.
Comparações
a parte, penso que a decisão representa um avanço, na medida em que os
genitores relapsos estarão sujeitos a uma punição eficaz. Afinal, o dever de
indenizar toca numa parte muito sensível do ser humano: o bolso.
Chegado
nesse ponto, confesso ao leitor estava dando voltas sobre o assunto, sem saber
como concluir. Foi então tive de acudir ao choro de nosso filho recém-nascido,
com as naturais cólicas da idade. Após um tempo de colo, já com a barriguinha
aquecida, ele se acalmou se rendeu ao sono... Que fantástica a imagem daquele
rostinho sereno completamente abandonado em nossos braços!.. Diante disso,
ocorreu-me apenas deixar registrada uma terrível dúvida: haverá dinheiro no
mundo que possa compensar a ausência desse momento?
Nenhum comentário:
Postar um comentário