Vi
recentemente uma charge muito criativa sobre a prova do ENEM. O desenho
continha um macaco, um elefante, um cachorro e mais alguns animais diante de um
examinador, que lhes dizia: “Vou ser justo na avaliação: vence a prova aquele
que subir primeiro naquela árvore”. E o artista desenhou o macaco com um
sorriso bem malandro, com ar de vitória.
Não
pretendemos analisar a questão em si da prova do ENEM. No entanto, a partir das
críticas que têm sido feitas, quais sejam, de que são tratadas de maneira igual
pessoas desiguais, o que consagra uma injustiça, podemos nos questionar se não
fazemos algo de semelhante com os nossos filhos em casa ou com os alunos em
sala de aula.
Muitos
de nós talvez já tenhamos dito ou ouvido frases do tipo: “Veja as suas notas da
sua irmã. Vocês tiveram as mesmas oportunidades, nós tratamos os dois
igualmente, por que você não tem o mesmo desempenho que ela?”. Ou, mais cruel
ainda: “Por que você não é igual ao seu irmão?”.
As
comparações são frequentemente injustas e desestimulantes. “Não sou igual ao
meu irmão porque sou um ser humano único e irrepetível em todo o universo”,
poderia responder esse filho. Além disso, tratar de maneira absolutamente igual
os filhos, no mais das vezes, consagra uma injustiça. É que se há de tratar de
forma diferente aqueles que são naturalmente diferentes.
Nossos
filhos e filhas não são iguais entre si e tampouco haverá em todo o universo
outro ser que seja absolutamente iguais a ele ou a ela. A ciência tem mostrado
que é possível formar grupos de pessoas a partir de algumas características
inatas que marcam o caráter. Porém, mesmo que seja possível identificar
semelhanças que permitam agrupar, para fins de estudos ou pedagógicos, as
pessoas em determinados padrões, cada um tem aspectos particularíssimos, sobre
os quais influíram o ambiente, as experiências etc., de modo que se desenha, em
cada ser humano, uma individualidade digna de ser apreciada e respeitada.
Vivemos
num mundo em que frequentemente se valorizam as pessoas quase que exclusivamente
pelo desempenho. Assim, um bom funcionário é aquele que se adapta aos padrões
da empresa ou da instituição e que atinge as metas propostas. É certo que se há
de premiar os resultados e valorizar o esforço que se faz para atingi-los. No
entanto, nesse cenário extremamente competitivo é comum se esquecer a infinita
dignidade de que é titular toda pessoa humana. E quando essa é valorizada
apenas pela capacidade de produzir, os mais débeis, como os idosos, os
portadores de deficiências ou os embriões corem o risco de serem tratados como
descartáveis.
Mas
talvez o mais grave é que em casa já fomentamos essa cultura. É o que fazemos
quando demonstramos apreço, carinho e admiração pelos nossos filhos
exclusivamente em função do desempenho escolar, ou, pior ainda, pelo fato de
nos trazerem problemas ou não. Ora, pai e mãe que não querem ter problemas na
educação dos filhos ainda não adquiriram suficiente maturidade para o exercício
da paternidade e da maternidade.
Nossos
filhos e alunos são diferentes entre si. Uns terão maiores habilidades para
trabalhos manuais, outros para os intelectuais; uns serão mais loquazes, outros
mais calados. É claro que as suas potencialidades podem ser desenvolvidas e
aprimoradas. Porém, é requisito essencial para o desenvolvimento que se
respeitem as suas naturais diferenças.
Os
filhos têm direito ao apreço e ao amor dos pais independentemente das suas
naturais habilidades. Se ponderássemos que cada filho ou cada aluno nasceu com
uma missão específica. Mais ainda, se considerássemos que, apesar das suas
debilidades, defeitos e limitações, ninguém poderá trilhar por eles os caminhos
a que foram chamados, então nos lançaríamos a cultivar neles com mais afinco as
virtudes necessárias para exercer o papel que lhes cabe nesse mundo.
Não
nos cabe, como educadores, descobrir qual é a missão que estão chamados a
seguir. Tampouco nos cabe a decisão de segui-la ou não. Mas é fundamental que
forjemos neles o desejo de descobri-la e a fortaleza para segui-la. E para isso
a formação que lhes damos nunca pode ser padronizada. Há de ser personalizada,
posto que cada um dos nossos filhos é único, assim como único é o caminho que
lhe cabe trilhar.
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