segunda-feira, 21 de março de 2011

Por um projeto familiar de sucesso

Há algum tempo ouvi de um amigo um comentário jocoso sobre a fórmula canônica do matrimônio, que consagra a união conjugal para toda a vida. Ele estava certo de que a indissolubilidade do vínculo matrimonial não passa de uma regra imposta pela Igreja Católica e que isso não faz mais nenhum sentido nos dias atuais.
É hoje muito difundida a convicção de que manter o casamento e a família por toda a vida é fardo pesadíssimo, quase que impossível de ser suportado. De fato, não é fácil construir uma vida conjugal feliz. Basta pouco tempo de convivência para perceber as inúmeras dificuldades que nos traz a vida a dois. No entanto, essa ideia de que é peso insuportável talvez esteja fundada na perspectiva com que se encara o compromisso e nas expectativas que cada um traz para o casamento.
Voltemos para a fórmula do casamento canônico com que brincava o meu amigo: “Eu, ..., te recebo, ..., como minha esposa e te prometo...”. Muitos põem o acento nessa promessa. Assim, poderão sustentar: “Como alguém com vinte ou trinta anos de idade pode prometer amor e fidelidade eternos num momento de suas vidas que não têm a menor noção do que será a vida conjugal no futuro?”.
No entanto, esse questionamento tem como fundamento uma concepção distorcida. No pacto matrimonial cada cônjuge se doa um ao outro, vale dizer, entrega a sua própria pessoa, tanto que daí surgirá uma nova identidade, qual seja, o estado de casado. Essa realidade se faz evidente na mesma fórmula com a expressão “eu te recebo”. Ora, somente se recebe algo que nos é dado. O compromisso que se assume é importante. Mas antes de se prometer amor, fidelidade e respeito, na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, há que se receber a pessoa do outro que se doa. E exatamente porque se recebe esse imenso dom é que se compromete a cuidar dele enquanto existir.
Outro provável motivo para se enxergar a indissolubilidade do casamento como um fardo pesado está em nossas expectativas. No início do relacionamento, é comum que o casal se sinta apaixonado. Trata-se de um sentimento inexplicável e que refoge ao controle. Mas é ao mesmo tempo uma sensação prazerosa: “quem sabe, sabe, conhece bem, como é gostoso gostar de alguém...”, canta a famosa marchinha de carnaval. Acontece que esse pulsar mais forte do coração e sentir as pernas fracas ao divisar, dentre inúmeras outras pessoas, aquela por quem se está apaixonado é, no contexto de uma vida, uma sensação que dura mais ou menos o que dura o sabor de uma torta de limão.
Além disso, ainda que seja saudável o enamoramento, ele pode conter uma não pequena dose de egoísmo. Com efeito, busca-se a pessoa do outro movido principalmente pelo prazer que o seu convívio proporciona. Assim, quando essa convivência não for mais prazerosa, diz-se que acabou o amor e então o melhor é partir para outro relacionamento.
Acontece que esse enamoramento é apenas uma fase inicial que há de culminar com uma doação. Não quer isso dizer que com passar dos anos o relacionamento há de se tornar insípido e pesado. Ao contrário, aquele sentimento pode ser nutrido e intensificado, tornando-se mais maduro e inclusive prazeroso. Mas não é exclusivamente ele que sustenta a união dos dois. Essa se perpetua na entrega recíproca que se traduz não apenas no querer o outro, mas em querer querê-lo(a) cada vez mais.

A torta de limão acaba e não fica nada. Quando muito um sabor amargo na boca. Aquele que doa algo duradouro conserva na alma a alegria estampada na face de quem recebeu o presente. E se esse presente somos nós próprios, então nos encontramos no outro, rejuvenescidos e fortalecidos a amar cada vez mais. E amamos com o nosso coração, mas não apenas com ele. Além do nosso afeto, nos doamos com a vontade e com a inteligência, numa entrega que tanto mais intensa tanto mais feliz será.

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