segunda-feira, 13 de julho de 2009

Enquanto ainda é tempo

Na semana passada fiz uma viagem de bicicleta com meus filhos. Quando escrevo essas linhas, eles ainda dormem, exaustos das pedaladas da véspera. Eu, porém, ainda trago martelando na mente alguns acontecimentos dia anterior. Fizemos uma trilha chamada “Caminhos da Fé”, na qual muitas pessoas, umas de bicicleta e muitas a pé, percorrem  caminhos de São Paulo e sul de Minas com destino a Aparecida. Ontem, ao cruzar com uns peregrinos, já curvados ao final da tarde após longa caminhada, um deles me disse: “é fantástico que consiga fazer isso com seus filhos. O meu só quer saber de computador e vídeo-game”. Ao chegarmos à pousada em que passaríamos a noite, também causamos certa perplexidade. Um dos viajantes perguntou com tom brincalhão a um de meus filhos: “o que seu pai lhe prometeu para que fizesse essa viagem com ele?”. “Nada”, respondeu ele meio vacilante. “Eu vim porque eu quis”, completou em seguida mais resoluto.
Essa frase do garoto deve nos levar a meditar em algo fundamental aos pais, professores e educadores em geral: a liberdade. Não há verdadeira educação sem liberdade. Mas isso não é fácil. É que todos nós que Possuímos uma missão de guiar alguém, em especial nesse mundo conturbado, temos também a forte tendência de querer impor nossos critérios, nossos gostos, enfim, nossa forma de ser. Contudo, não podemos nos esquecer de que cada ser humano é absolutamente único e irrepetível. Aquilo que foi bom e funcionou conosco, poderá não sê-lo para nossos filhos ou alunos.
Isso não implica, evidentemente, que devamos pensar que não há certo e errado, que tudo depende do ponto de vista que se observa, e, com isso, não façamos nada para formar os nossos filhos e alunos. Isso seria cair num relativismo que aniquila a personalidade dessas pessoas a quem tanto amamos e temos a obrigação grave de conduzir nos caminhos da vida. Porém, a missão do educador é muito semelhante à de um guia que vai orientando sobre os perigos, aconselhando sobre os cuidados que deve tomar, sobre o modo de proceder em cada situação. E, quando se deparam com alguém mais teimoso, por vezes deixam que levem uns tropeços, pois esses também podem ser muito pedagógicos.
Educar na liberdade implica não dar importância a picuinhas que envenenam a vida familiar sem trazer nenhum proveito à formação dos filhos. Há pais que se desgastam e perdem o tempo e a paz implicando com as crianças que apertam o tubo de creme dental no meio e não caprichosamente em uma das extremidades. Outros que exigem que coloquem primeiro o feijão no prazo e depois o arroz, ou vice-versa. E, quando são contrariados, não faltam censuras, reclamações e até broncas humilhantes na frente dos outros, que não edificam nada, mas geram revoltas e incompreensões.
Penso que deveríamos aprender a relevar esses detalhes sem importância e nos centrarmos no que é realmente fundamental para os nossos filhos e alunos: que descubram o valor da amizade e do respeito pelo próximo, que aprendam mais com o nosso exemplo do que com discursos ou sermões que é bom desempenhar os trabalhos e demais atividades do dia com alegria e espírito de serviço. E isso não se consegue sem liberdade. Afinal, alguém conseguiria forçar alguém a amar?
Ainda na viagem, após o jantar, eu me detinha no quarto com uma leitura que me agradava, quando meu filho mais velho me fez uma advertência: “Pai, a conversa não está boa. É melhor você chamar o João para cá”. Respondi-lhe mais por preguiça que por convicção: “Filho, ele é livre, não posso forçá-lo”. Mas ele argumentou: “é pai, mas ele é muito novo e poderá pensar que aquelas bobagens que estão dizendo são corretas”. “Você tem razão, filho”, disse-lhe e fui chamar o garoto para assistirmos a um filme juntos.

De fato, educar na liberdade não quer dizer que devamos esquecer que há uma verdade objetiva, que não é tudo relativo e dependente do ponto de vista. E nisso o educador não pode transigir, tal como o guia que não permite que aquele que conduz pelas sendas de um caminho perigoso caia num precipício, mesmo que tenha de se valer da força para salvar-lhe a vida. 

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