segunda-feira, 29 de junho de 2009

Liberté, Egalité, Fraternité

Reacendeu-se recentemente na França a polêmica sobre o uso da burca pelas mulheres muçulmanas, tanto que o Presidente Nicolas Sarkozy, discursando no Congresso de Versalhes para deputados e senadores, defendeu a sua proibição.
Será isso uma nova expressão dos ideais da Revolução Francesa: liberdade, igualdade, fraternidade? As idéias são dinâmicas, tal como a rosa que, ao desabrochar, assume novas feições sem deixar de ser a mesma que era quando não passava de um promissor botão. Sendo assim, proibir agora que as mulheres usem a burca, como impedir de freqüentar as escolas públicas os judeus trajando os seus quipás e os cristãos de levar no peito o crucifixo, seria uma espécie de apogeu daqueles ideais atingido agora no terceiro milênio?
Que me perdoe o leitor a ironia, mas acredito que é necessário formar uma visão muito crítica acerca do que se pensa hoje em dia sobre liberdade, igualdade e fraternidade.
Para vivê-los, não é necessário arrancar Deus da vida das pessoas. Aliás, a maior expressão da liberdade se encontra no interior do ser humano. Refiro-me à liberdade de ser o que de fato é. No recôndito de cada consciência é que se pode ser ou não livre.
A história é pródiga de exemplos disso. Podemos aqui citar a vida do cardeal vietnamita François-Xavier Nguyên Van Thuân. Rumo à prisão, na qual permaneceu por treze anos, tomou ele uma decisão: Vinham-me à mente muitos pensamentos confusos: tristeza, abandono, cansaço depois de três meses de tensões... Porém, em minha mente surgiu claramente uma palavra que dispersou toda a escuridão, a palavra que Monsenhor John Walsh, Bispo missionário na China, pronunciou quando foi libertado depois de doze anos de cativeiro: ‘Passei a metade da minha vida esperando’. É verdadeiríssimo: todos os prisioneiros, inclusive eu, esperam a cada minuto sua libertação. Porém, depois decidi: ‘Eu não esperarei. Vou viver o momento presente, enchendo-o de amor. Por mais amarras que obstavam a esse grande homem de ir e vir, alguém duvidaria de que sua alma experimentava, ainda que no cárcere, uma imensa liberdade que o permitia viajar, amar e deleitar-se nos braços d’Aquele que sempre foi a razão de sua vida?
E também vivia uma fantástica fraternidade. Prisioneiro, não conseguia se comunicar com o seu rebanho. Valeu-se então da criatividade impelida pelo amor fraterno: Em outubro de 1975, fiz um sinal a um menino de sete anos, Quang, que regressava da missa às 5 horas, ainda escuro: ‘Diz à tua mãe que me compre blocos velhos de calendários’. Mais tarde, também na escuridão, Quang me traz os calendários, e em todas as noites de outubro e novembro de 1975 escrevi da prisão minha mensagem ao meu povo. Cada manhã o menino vinha recolher as folhas para levá-las à sua casa e fazer que seus irmãos e irmãs copiassem-na. Assim foi escrito o livro “O Caminho da Esperança”, posteriormente publicado em vários idiomas.
Igualdade, muito se lutou, com avanços e retrocessos no sentido de que os recursos manteriais, a ciência, a cultura, a educação, enfim, todos os bens, sejam partilhados com eqüidade entre os homens e os povos. Isso não implica, porém, que os homens e as mulheres devam ser tratados de forma idêntica, como uma pilha de tijolos em que as individualidades simplesmente se perdem no meio de uma coletividade. A maior expressão da igualdade a que todos anseiam é que cada ser humano seja reconhecido como indivíduo, único e irrepetível.

Mas não há motivo para se afligir em demasia. Podem arrancar a burca da fronte, os quipás da cabeça ou o crucifixo do peito, mas, de nenhum desses homens e mulheres que anseiam por trazer esses símbolos, poderão arrancar as convicções nobres e limpas que forjaram seus corações.

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