segunda-feira, 8 de junho de 2009

Desastre aéreo

O recente desastre que vitimou centenas de pessoas que estavam a bordo do avião da Air France chocou o mundo. Em situações como essas mal conseguimos conter um grito de protesto que brota do mais fundo de nosso ser. Vemos ali jovens recém casados que partiam felizes em lua-de-mel levando imensos sonhos de felicidade na nova vida conjugal. Afinal, ainda há pouco ouviram o sacerdote pronunciar na liturgia do casamento a súplica para que tivessem juntos uma vida longa e feliz... E tantos jovens com uma vida profissional promissora, no desabrochar das realizações, vêem tudo isso ser literalmente atirado ao mar... Por quê?
Penso que tragédias como essa, que por certo tocam fundo na alma, nos abalam porque nos colocam diante de uma realidade perante a qual temos de assumir uma posição: a nossa morte. Mas é necessário que meditemos nisso, pois a nossa felicidade, já nesta vida, depende em grande medida de como encaramos a morte, nossa e dos outros.
São muito diversas as maneiras com que as pessoas encaram a morte. Porém, poderíamos agrupá-las em três vertentes distintas.
Uns teimam em pensar que hão de viver para sempre. Por certo não se atreverão em sã consciência a dizer isso abertamente, mas agem como tal. Estão aqui aqueles que mantêm uma preocupação excessiva com a saúde, que diante do menor espirro correm para os consultórios médicos e perdem dias e semanas realizando exames intermináveis. Nesse grupo há alguns ricos que pagam médicos para estarem próximos vinte e quatro horas por dia, a fim de que, diante do menor perigo, intervenham para salvar-lhes a vida. Ocorre que esses pobres coitados, de tanto se empenharem em não morrer, se esquecem de viver.
Há também aqueles que se rendem diante da realidade inexorável da morte, porém, sempre abafam a idéia, colocando-a para um momento suficientemente longínquo, de modo a não os incomodar. Vivem um falso carpe diem: comamos e bebamos que amanhã morreremos. Vão então empenhados em dar algum sentido aos seus dias: suportam o trabalho, pois na sexta haverá a cervejinha com os amigos; suportam as bagunças dos filhos em férias, pois em breve voltarão às aulas; suporta a esposa, o marido, pois em breve farão aquela viagem. E então dá-se a impressão de que se vive apenas naqueles momentos aprazíveis: jantar, viagem, esporte, saída com os amigos e, os demais, suportam-se, aguardam-se. No entanto, temos uma vida para ser plenamente vivida a cada minuto. Além disso, mesmo esses momentos que deveriam ser agradáveis surgem as contrariedades. É a cerveja que não está tão gelada como gostaríamos, são as malas que tardam em chegar, é a esposa (ou o marido) que ousa estar de mau humor justo agora que fazíamos a viagem dos nossos sonhos...
Mas há os sábios, que encaram essa dura realidade com valentia. Não ignoram que será terrível, mas ao mesmo tempo vivem persuadidos de que virá quando melhor nos convier, por um desígnio que em muito supera a nossa capacidade de entendimento. Também consideram que é muito curta essa nossa passagem, de modo que urge bem aproveitá-la. São esses que se empenharão em se dedicar mais à esposa ou ao marido, em cuidar do pai ou da mãe doentes, em estar com os filhos e com os amigos, em trabalhar com mais dedicação, pensando no bem daqueles que dependem do seu trabalho.

Há alguns dias estive no velório de um grande amigo. Estava lá um sacerdote a quem tenho um grande apreço. Quando o vi, notei que chorava muito. Mas, em certo momento, como que inundado por um repentino consolo do Céu, suas lágrimas secaram e o seu semblante exalava novamente paz e serenidade. E então se aproximou de mim, que agora ainda mais chorava por vê-lo triste, e me disse: “É, meu caro, as pessoas morrem!”. Pensei comigo um tanto quanto indignado: “O Senhor estava se esvaindo em prantos até há pouco. E agora que obteve um consolo começa a me repreender por extravasar a minha emoção?!”. Mas antes que eu esboçasse qualquer palavra, ele me interrompeu com um abraço terno e afetuoso. E então as palavras se fizeram inúteis. Com efeito, como exprimir a dor? “Aproveitemos para rechear de amor os dias que nos restam!”, disse-me ele com o seu indisfarçável sotaque espanhol.

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