Na semana passada ouvi num programa de rádio um
debate. Nele o apresentador expôs aos dois entrevistados a seguinte afirmação:
“Hoje em dia, a solidão mata mais que o cigarro. Você concorda com isso?”.
Trata-se de um tema interessante. Normalmente naquele programa a conversa
envereda mais para a política ou economia, e as considerações são muito sábias.
Nesse assunto, porém, os comentários deixaram a desejar. É que ora se afirmou
que no mundo moderno, com as facilidades de comunicação, em especial com os
recursos da internet, é muito raro uma pessoa estar verdadeiramente sozinha,
ora se disse que a solidão chama o cigarro e, sendo assim, não se sabe quem
mata mais. Penso que essas respostas dadas pelos entrevistados nos remetem para
uma indagação mais profunda: as facilidades de comunicação que temos atualmente
fazem com que as pessoas se sintam de verdade menos solitárias? Afinal, o que é
a solidão?
Curiosamente era o dia do meu aniversário. Nessa
data, é comum que fiquemos um pouco mais sensíveis, como que aguardando para
ver como é que nos consideram, quantos vão se lembrar de nós... Enquanto seguia
com esses pensamentos e buscando uma definição para a solidão, tocou o
telefone. Era a minha esposa levando os filhos ao colégio e, mal atendi, começou
soar aquelas vozes alegres e gritantes de crianças: “Parabéns pra você...”. Eu
havia saído muito cedo e eles não conseguiram me cumprimentar pessoalmente pela
manhã, o que motivou a mãe a ter essa feliz idéia. Que delícia de gesto! E não
parou aí. Ao voltar à casa ao final do dia, mal pisei na sala e estavam todos a
postos, agora para entoar o canto de parabéns ao vivo... Era tanta demonstração
de carinho e apreço que não conseguia resolver interiormente aquele assunto: o
que é a solidão?
Comecei, então, num exercício de imaginação, a pensar
como seria a minha vida sem essas pessoas que se lembraram de mim naquele dia:
os filhos, a esposa, os pais, os amigos, os colegas de trabalho etc. E
aproveitei também para tirar todos aqueles que me são caros, mesmo que não se
tivessem lembrado da data. Que horror! Foi um aperto tão grande, uma sensação
de vazio tão insuportável, que ameacei interromper aquele vôo da imaginação.
Mas, antes disso, pus-me a pensar se a internet poderia preencher aquele espaço
todo. Haveria um chat para comemorar
aniversário? Mas com quem? Poderia lançar-me numa aventura virtual? Bem, mas se
for assim essa pessoa terá de ser exatamente como a minha esposa, pois do
contrário não quero...
Não sei o que os filósofos pensam disso, aliás,
entendo muito pouco de filosofia, mas como que num estalo me veio uma definição
para a solidão: solitário é aquele que não é ou não se sente amado. Essa é a
verdadeira solidão. Podemos estar momentaneamente sem uma companhia fisicamente
presente. Podemos até nos isolar do mundo, como fazem algumas pessoas por
convicções religiosas ou por simples opção. Mas não podemos jamais suportar a
indiferença total e absoluta.
Mas se o que aplaca a solidão é ser e sentir-se
amado, o problema que vimos tratando apenas se desloca de lugar, pois nos
remete à outra indagação: o que fazer para sermos e nos sentirmos
verdadeiramente amados?
Penso que a melhor resposta a essa indagação me é
dada pelo exemplo de um grande amigo e colega, que é um sujeito feliz e de
muitos amigos que o estimam de verdade. Certa vez lhe perguntei sobre como
estava a sua mãe. Como resposta, ele começou a elencar as atividades que ela
havia feito nos últimos dias e, com isso, conclui que ela estava bem. O exemplo
desse meu amigo é encantador. Tem olhos repletos de delicadeza para ver os
detalhes do dia naquela que ama e, com isso, concluir que ela está feliz.
Esse é como que o outro lado da moeda que devemos
considerar ao pensar na solidão. É que quanto mais nos empenhamos em pensar em
nós mesmos, em nossos gostos, em nossos caprichos, em suma, quanto mais
egoístas formos, mais nos distanciaremos das pessoas. Como dizia um grande
sábio: “Ninguém é feliz, na terra, enquanto não se decida a não sê-lo”. Ou seja,
ocuparmo-nos em fazer felizes aqueles que nos cercam é o único remédio
absolutamente eficaz contra a solidão.
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