Outro dia conversava com um amigo que mora em
Campinas e trabalha em São Paulo. Sei
que a peregrinação dele já dura mais de dez anos, e então brinquei com ele:
“com a vinda do trem-bala as coisas vão ficar melhor para você”, ao que ele
respondeu empolgadamente: “puxa, você não sabe como sonho dia e noite com isso!”.
Trata-se de uma aspiração legítima, querer que
inovações tecnológicas tornem mais fácil o nosso dia-a-dia. Contudo, há muitas
pessoas que não vivem, mas estão sempre aguardando situações ideais que, quando
surgirem, “então sim, poderão desfrutar da vida”. Soube de uma pessoa que
aguardou por anos a sua aposentadoria, de modo a poder desfrutar de mais tempo
para ficar em casa.
Ocorre que, logo que isso aconteceu, notou uma infiltração
enorme no muro do vizinho, que lhe deixava o quintal com um aspecto horrível. E
ele que há muito aguardava a aposentadoria, agora aguarda o conserto do muro,
para “levar a sonhada vida tranqüila...”
O problema é que essas situações ideais e imaginárias
nunca chegam. Com efeito, mal atingimos aquilo que esperamos, surgem novos
problemas. Isso sem contar que aquilo com que tanto sonhamos não traz tantas
realizações assim. Como disse com muita sabedoria Quincas Borba, no célebre
romance de Machado de Assis: “aos vencedores, as batatas”.
Penso que tudo o que temos de verdade é o momento
presente, o hoje e o agora. E é nele e somente nele que nos cabe viver e sermos
imensamente felizes, apesar dos muitos problemas que possamos ter. Isso não
quer dizer que devamos ser irresponsáveis a ponto de não pensar no futuro, de
não prever, esperando que tudo caia do céu. No entanto, devemos nos ocupar do
futuro apenas com relação ao que nos cabe fazer hoje por ele. Por exemplo, há
pessoas que perdem noites de sono pensando como irão pagar a faculdade do filho
que ainda não nasceu. Ora, quanto à faculdade do filho, se há uma reserva de um
pouco de dinheiro para fazer agora pensando nisso, que se faça, se não tiver,
que se aguarde o momento em que se poderá fazer, e depois, sigamos adiante, com
a tranqüilidade e a serenidade de quem vive a vida a cada minuto.
Por vezes nos sentimos esmagados, não com o peso dos
problemas que temos, mas com o daqueles que imaginamos que no futuro teremos, ou,
pior ainda, ficamos remoendo do passado. Ora, o passado é para ser enterrado e
dele extrairmos apenas a experiência para sermos cada vez melhores, para cada
vez errarmos menos. E o futuro somente nos cabe ser considerado para aquilo que
objetivamente se pode fazer hoje para que ele seja melhor.
Soube de um pequeno diálogo que se deu entre um
policial rodoviário e um caminhoneiro. Perguntou o guarda: “quantas toneladas o
seu caminhão comporta?”, ao que o caminhoneiro respondeu: “mais ou menos umas
cem mil”. O guarda olhou desconfiado e foi ver as especificações do veículo,
quando constatou que o pequeno caminhão comportava apenas quatro toneladas, e
então ponderou: “Mas no documento consta apenas quatro”. “Bom, isso de cada
vez”, disse o caminhoneiro sorrindo, “mas eu não levo tudo de uma vez. Carrego
aqui e ali adiante descarrego, volto a carregar e assim vou levando. No final
desses anos todos, se cuidar bem direitinho do meu caminhãozinho, acho que bem
umas cem mil toneladas ele vai levar”.
Parece ingênua a conclusão do caminhoneiro, mas é sábia.
É o que ocorre conosco. Não temos força para levar nas costas ao mesmo tempo
todo o peso do passado que já vivemos e do futuro que imaginamos. Morreríamos
esmagados e não sairíamos do lugar. Porém, para o peso de hoje temos força para
carregar. E, se pensarmos bem, nunca é mais pesado que as costas. E quanto bem
não teremos feito aos demais ao cabo de uma vida, um pouquinho de cada vez...
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