Tem-se notado que os adeptos da chamada
descriminalização do aborto têm, de certo modo, mudado o discurso. Afirmam
agora que “ninguém é favorável ao aborto”, que deve mesmo ser evitado. Porém,
dizem eles, manter a prática do aborto como crime somente aumenta os abortos
clandestinos, com sérios riscos à vida ou à saúde da mãe.
Diante desse cenário, qual seja, de que o aborto é
tido como uma conduta indesejável, inclusive pelos que defendem a
descriminalização, os defensores do direito incondicional à vida desde a
concepção e, portanto, contrários ao aborto, poderiam se unir àqueles, quiçá em
programas comuns em favor da gestante?
A resposta é complexa. Primeiro há que se investigar
a boa-fé dos que se dizem contrários ao aborto, mas favoráveis à
descriminalização. É que muitas vezes, por detrás de um discurso aparentemente
humanitário, há uma campanha muito forte no sentido de legalizar o aborto pura
e simplesmente com um método de controle da natalidade. O propósito de poupar a
vida e a saúde da gestante é colocado apenas como argumentos sentimentais para
ocultar os reais fins visados. Com esses, evidentemente, não há a menor
possibilidade de diálogo. O aborto, como forma de controle da natalidade, é
inaceitável, já que atenta contra a dignidade da pessoa humana. É que essa não
é apenas um número, mas um ser único e irrepetível em todo o universo.
Mas tomemos o discurso como verdadeiro, ou seja, que
o foco da preocupação seja mesmo a vida e a saúde da gestante. Nesse caso, segundo
eles defendem, com a descriminalização, a gestante deveria procurar as
instituições de saúde públicas ou privadas que estariam autorizadas ao
procedimento. Nelas teria todo um trabalho de acompanhamento, visando dar-lhe
meios para levar a gravidez adiante. A mãe teria um acompanhamento psicológico
e de outros profissionais afins, acenando-lhe, se caso, com a possibilidade de
adoção posterior, tudo tendente a demovê-la desse propósito.
Muito bem. Mas suponhamos que a mãe, apesar de tudo
isso se mantenha insensível e diga: “não, eu quero o aborto”. E então, o que
fazer? Segundo essa concepção as clínicas seriam apenas uma espécie de “isca”
em que a mãe vem para fazer o aborto, mas nela encontrariam profissionais que
afastam dela esse propósito? Será que isso funcionaria? Ressaltando o profundo
respeito que tenho pelos que pensam diferente, acredito que é preciso muita ingenuidade para
aceitar tais argumentos.
Dizem que não se quer estimular o aborto, mas
tão-somente que deixe de ser crime. No entanto, descriminalizar é deixar o
nascituro sem direito à vida. Como já sabem os juristas, nem tudo o que não é
crime é lícito. Por exemplo, deixar de pagar uma prestação não é crime, como
dizem, “não dá cadeia”. Mas nem por isso é correto. Quem não cumpre com suas
obrigações poderá sofrer uma ação judicial de cobrança, ter seu nome inserido
nos serviços de proteção ao crédito etc. Mas e o nascituro? Se deixar de ser
crime o aborto, terá ele de contratar um advogado para obrigar a sua mãe a
esperar por mais alguns meses até que nasça?
Se é possível alguma espécie de parceria entre uns e
outros, penso que seja no desvelo pela gestante. Nós, que defendemos
incondicionalmente a vida, diríamos a uma candidata ao aborto: “a maternidade é
um dom precioso, talvez o mais nobre que o ser humano possui. As dificuldades
com o pai, esposo, namorado é muito pouco diante da alegria de trazer um novo
ser ao mundo”. Poderíamos levá-la a uma maternidade e sentir a alegria que
envolve esse maravilhoso acontecimento. Ou chamá-la a ouvir o bater do coração
do bebê, ver seus movimentos graciosos já no ventre da mãe, e talvez fazê-la
sentir que o que ele está a dizer: “mamãe, eu estou aqui e quero ser amado”.
Mas não é só. Aquelas que tiveram a desgraça de fazer
um aborto, também merecem atenção. Não diríamos a ela que “tudo bem”, que “as
circunstâncias justificavam”. Diríamos com sinceridade que o ato foi horrível,
mas que nem por isso ela deve se desesperar. Que sempre há uma saída para
aqueles que buscam verdade. Que sempre é possível o perdão e a reconciliação.
Em Campinas há um trabalho, chamado de Serviço de
Acolhimento à Gravidez Indesejada (acolhimentogravidez@hotmail.com;
Fone: 19-9113-2532), que trabalha exatamente nessa linha. Os que lutam de
verdade pela vida e pela gestante estão convidados a fazerem parte dessa
equipe.