segunda-feira, 21 de janeiro de 2008

Ética na Justiça

Tem causado certa perplexidade a oferta à Justiça Federal pelo traficante colombiano, Juan Carlos Ramírez Abadía, no sentido de entregar à União federal US$ 35 milhões (R$ 60,7 milhões), que estariam escondidos no Brasil, em troca de benefícios que lhe seriam concedidos em processo penal. Não pretendo tecer comentários sobre o caso em si. É que estou impedido por Lei. E, ademais, há anos que não exerço a judicatura na área criminal, de modo que nem teria atualizados conhecimentos técnicos para tanto.
Mas ocorre que, dentre as críticas dirigidas à decisão, está a que afirma que o dinheiro poderia ser muito bem utilizado em obras sociais de notório interesse público. Esse argumento nos coloca diante de uma indagação de forte conotação ética: até que ponto as vantagens econômicas imediatas devem influir nas decisões judiciais? E essa indagação nos remete para outras que, no fundo, caem em um ponto essencial a ser enfrentado pelo juiz: os fins justificam os meios?
É inegável que o juiz sofre diversas influências, externas e internas, que são determinantes em suas decisões. Quando se está para proferir uma decisão que causa repercussão, chegam até ele os rumores e as ansiedades, dentre outros, dos repórteres que aguardam ávidos pela “novidade”. E mesmo que não se tenham maiores repercussões, o próprio sofrimento dos envolvidos, o clamor por justiça pelas partes também não lhe é indiferente. Além disso, como homem (ou mulher), o juiz sofre as influências internas. O fato de ter passado por situação semelhante à das partes envolvidas, suas convicções e suas experiências de vida também são determinantes no momento de decidir.
Nesse contexto, qual seja, cada juiz tem experiências de vida, convicções e cultuam valores diferentes, como se pode pretender que as decisões sejam justas? Penso que para isso é necessário que o julgador paute suas decisões pela Lei e por sua consciência. Mas esse critério, por si só, não é suficiente. É que a lei sempre está sujeita a interpretações diferentes, as quais são ditadas pelos fatores que mencionamos. E tampouco a consciência será determinante para se proferirem decisões justas, pois as consciências poderão não estar bem-formadas.
Penso que não há como se equacionar esse problema sem se aceitar a existência de um direito natural, gravado de forma indelével no coração do homem e na própria natureza das coisas. É que essa norma, que antecede às leis dos Estados, deve não somente nortear a elaboração das leis pelo legislador, como influenciar o julgador ao aplicar a lei. Mais que isso. O próprio juiz há de bem formar a sua consciência, desvendando cada vez mais e melhor o que diz essa lei natural em cada situação que tem diante de si.
E quando se busca, de boa-fé, crescer no conhecimento dessa lei natural, desvendam-se algumas regras fundamentais, dentre as quais se pode destacar que: nunca é permitido fazer o mal para que daí advenha um bem; tudo quanto quer que os outros façam conosco, devemos nós próprios fazer a eles; há de se ter um profundo respeito pela consciência do próximo, em especial, daqueles que pensam diferente de nós, o que não quer dizer que se deva aceitar como um bem aquilo que é objetivamente um mal.

Diante disso, penso que nem trinta e cinco milhões de dólares, nem todo o dinheiro que existe no mundo, ainda que a pretexto de trazer um grande bem a muitas pessoas, não justifica um ato sequer, por menor que seja, que contrarie os ditames da consciência. Dizem por aí que “todo homem tem seu preço”. Talvez isso tenha um fundo de verdade. Mas há aqueles em cujos bolsos só entram uma espécie de moeda: aquela cuja fonte foi criteriosamente investigada por uma consciência bem formada.

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