segunda-feira, 6 de agosto de 2007

Pacificar com Justiça

Diante da morosidade e dos demais problemas que enfrenta o Poder Judiciário, tem-se buscado soluções alternativas para os conflitos, muitas delas direcionadas a estimular que os próprios litigantes encontrem a conciliação. Penso que a idéia é muito interessante. Porém, não pode ficar adstrita aos meios forenses. Ao contrário, somente atingirá o efeito esperado se contar com o apoio de toda a sociedade.
Diz-se que a finalidade da jurisdição, função primordial do Poder Judiciário, é a pacificação com justiça. Trata-se de uma nobre e ao mesmo tempo ousada missão a de restabelecer a paz entre as pessoas, abalada pela existência de conflitos travados com seus semelhantes. Essa afirmação nos remete, porém, para outros questionamentos: o que é paz? E o que é justiça?
Quando uma pessoa pode dizer sinceramente “estou (ou vivo) em paz?”. Trata-se de um conceito que transcende à existência de conflitos. Nem muito menos se identifica com a ausência de problemas. Afinal, não existe pessoa que não os tenha, de modo que vincular a paz interior à ausência de problemas é simplesmente condenar-se a não ter paz.
E a justiça tem muito que ver com a paz. É que a justiça consiste em dar a cada um o que lhe é devido. Assim, haverá justiça uma sociedade na medida em que os indivíduos que a compõem se empenham de verdade em dar ao semelhante o que é seu. E isso em todos os aspectos: familiar, profissional, social etc. Nesse sentido, é justo o pai que dá atenção ao filho, pois, ao fazê-lo, lhe está dando o que é devido. Por igual razão, são justos o esposo e a esposa que são fiéis, pois com isso dão um ao outro o que lhe é devido. Enfim, é justo o empregador que respeita os direitos do empregado, como o é o empregado que trabalha com diligência e dedicação.
Assim exposto o que são justiça e paz, fica clara a enorme dificuldade, para não dizer impossibilidade, de o Poder Judiciário fazer verdadeira justiça e trazer a paz aos cidadãos, ao menos com toda a profundidade que isso implica. Com efeito, como pode o pai ser instado a ser prestativo e dedicado? E o mesmo ocorre também quando a questão é predominantemente econômica, como por exemplo, o atraso no pagamento do salário. É que, mesmo que o empregado consiga após anos receber o dinheiro a que tinha direito, o que ele realmente esperava é que sua remuneração fosse paga em dia.
Nesse sentido, penso que o máximo que se pode esperar do Judiciário é que faça, coercitivamente, aquilo que quem estava obrigado não o fez de forma espontânea, punindo ainda, de alguma maneira, quem viola o direito alheio.
Uma situação de justiça na sociedade, porém, jamais poderá ser alcançada exclusivamente pela atuação do Judiciário. É que a justiça que verdadeiramente se espera pressupõe que cada qual seja muito exigente consigo mesmo no sentido de dar ao outro o que lhe é devido.
Além disso, não vivemos isolados, mas, ao contrário, relacionamo-nos com nossos semelhantes, de modo que podemos ajudá-los a resolver os muitos conflitos em que se envolvem. Não se trata de instituir uma espécie de “bisbilhotice” institucionalizada, de modo que cada qual se sinta no direito de invadir a vida dos outros a pretexto de apaziguar os seus conflitos. Porém, com delicadeza e com profundo respeito pela liberdade, pode se dar conselhos oportunos, fazendo ver o outro lado do problema.

Nesse momento em que tanto se fala em soluções alternativas para os conflitos, temos de forjar a firme convicção de que é missão de todos construir a paz na sociedade. Para isso temos de aprender a olhar para cada pessoa como um ser humano, que sofre e chora com os com seus conflitos, e que nos esforcemos por amparar-lhes. Do contrário, a tão sonhada pacificação com justiça não passará de mera ilusão, ou, se preferirem, perfumaria jurídica.

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