Certo dia, proferi uma frase mal-educada à minha
esposa, o que foi presenciado pelo meu filho. Sem demora, com os olhinhos um
pouco tristes, um pouco indignados, ele disse-me: “eu prefiro que você brigue
comigo do que fale desse jeito com a mamãe”.
Eu já havia ouvido de especialistas que os filhos se
sentem mais seguros em notar que os pais se amam entre si do que com
demonstrações de afeto diretamente para com eles, pois, mais que serem amadas,
as crianças desejam ardentemente se sentirem frutos de um amor. Mas o fato é
que isso que havia visto em livros e cursos, nunca havia notado tão fortemente
na prática, de tal forma que a justa censura do sábio garoto encheu-me de
vergonha.
Convém, pois, que pai e mãe meditem sobre como anda o
relacionamento e em que medida isso tem contribuído ou prejudicado a formação
dos filhos.
É inevitável que haja brigas entre o casal. Aliás,
ouso lançar um desafio: se alguém conhece um casal que nunca se desentendeu,
ainda que levemente, que envie uma mensagem para o meu endereço eletrônico,
pois vou tentar fazer que saia na próxima edição do Guinness.
Assim, se os desentendimentos são como que “naturais”
na vida do casal, mas, por outro lado, causam grandes males aos filhos, como
solucionar a contradição?
Ainda que inevitáveis as brigas, deve haver um
esforço constante para que as relações conjugais sejam cada vez melhores. O
relacionamento entre marido e mulher pode ser comparado como uma encosta
íngreme a ser percorrida. Quando se dispõe a subir a montanha, não se consegue
ficar parado, ou se avança, ou se retrocede. É bem verdade que mesmo aqueles
que se empenham por subir um pouco a cada dia, por vezes caem e, quando se dão
conta, retrocederam um bom caminho, mas isso não importa, pois se há determinação,
logo se recupera, com folga, o trecho perdido.
Nessa luta, é importante que cada um descubra os
próprios defeitos, em especial aquele que mais desagrada o outro. E mais que
descobrir, travar uma batalha decidida por vencê-lo. O grande mal é que cada um
pensa que o problema está no outro e, com isso, nada faz para melhorar.
Vejamos um pequeno exemplo. Ele, ciumento do trabalho
profissional dela, queixa: “você agora só pensa em seu trabalho e nem se
importa mais em manter a casa agradável”. Ela: “você é que é um folgado.
Encontra tempo para jogar futebol e tomar cerveja com os amigos, mas não me
ajuda nas tarefas da casa”. E os exemplos são infindáveis. Cada um de nós pode
imaginar o roteiro das nossas discussões, todas elas com acusações recíprocas
sem que cada um reconheça os próprios defeitos.
No entanto, o ponto de luta é outro. Ou seja, cada um
deve pensar “o que ela (ou ele) tem de razão no que fala de mim? O que posso
fazer para ser melhor?”. É bem verdade que, feito isso, é necessário que o outro
também se empenhe em mudar. Mas para isso, não se consegue nada no meio de uma
discussão. Passado um dia ou dois, quando estiverem calmos, a sós, então se
fala: “olha, isso que você faz, desagrada-me muito. Pense se não pode se
esforçar um pouco para fazer desse jeito ou daquele...”. E depois deve estar
disposto a ouvir também, porque por certo que o outro também terá muitas
“críticas constritivas” a fazer.
Mas ainda que isso seja feito, mesmo assim surgirão os
desentendimentos. Há então que se colocar um forte empenho para que as brigas
não ocorram na frente dos filhos. Se é natural brigar, não o é diante deles,
tanto mais se as brigas forem por sua causa. Por exemplo, o filho pede algo ao
pai, e ele nega, em seguida, pede à mãe, que consente e, formado o problema,
passam a discutir na frente do filho por esse motivo. Quando isso ocorre, a
mensagem que se passa é que não há certo e errado e que os pais não se entendem
sequer a respeito do que é melhor para ele, gerando uma terrível insegurança na
criança ou adolescente.
Mas se isso ocorrer, deve se tomar cuidado para que os
filhos presenciem também a reconciliação. É que eles costumam ver as brigas,
mas não vêem o momento posterior em que fazem as pazes, ficando com a impressão
de que estão sempre brigados.
Um grande defensor da paz e da alegria nos lares
aconselhava aos casais que jamais brigassem diante dos filhos e que as brigas,
naturais entre marido e mulher, não se prolongassem por mais de um dia, de modo
que não se deitassem sem antes fazer as pazes. E mais, aconselhava ele que
aquele que pensa ter razão na discussão, que seja o primeiro a pedir perdão.