quarta-feira, 28 de dezembro de 2005

Vale a pena

Na edição de 17 de dezembro último, o Correio Popular trouxe uma reportagem intitulada “Separações judiciais disparam na RMC”. A matéria vem embasada em dados estatísticos fornecidos pelo IBGE, onde se constata que, em 2004, treze casais por dia puseram fim ao casamento na Região Metropolitana da Campinas.
Os números, ainda que alarmantes, não me surpreenderam. Por quase cinco anos trabalhei em uma vara judicial que possuía competência para questões de família, e raros eram os dias em que não se fazia nenhuma separação ou divórcio. O que não aparece nas estatísticas, porém, são a dor e a mágoa que esses casais traziam consigno naquele momento extremamente difícil para eles.
Com a experiência desses anos, posso afirmar que se contam nos dedos de uma mão os casais que se apresentavam alegres no momento em que afirmavam o propósito de se separarem. E, mesmo dentre esses que se diziam “felizes”, o que se notava era mais um alívio por romper uma situação indesejável que propriamente felicidade.
Quando indagava aos casais sobre os motivos da separação, ou mesmo se estavam convictos disso, não raro um deles se desmanchava em lágrimas, permeadas da frustração por não se ter conseguido levar adiante o que, no dizer deles mesmos, se propunha ser para sempre. Isso sem contar o que se passa com os filhos. “Se me rasgassem ao meio teria doído menos” – confidenciou um deles durante a instrução de um processo.
Se as separações têm causado tanto mal aos casais, aos filhos, às famílias, e, por conseqüência, à sociedade, não seria hora de se fazer algo por isso? Seria correto ver nesses números uma tendência natural dos tempos modernos, com relação ao que nada se pode fazer para conter? Haveria um remédio capaz de curar essa doença social ou os casais devem continuar contando exclusivamente com a sorte?
Certa vez, na saída de uma celebração de suas bodas de ouro, o marido foi indagado sobre o segredo de um casamento longo e feliz. O interlocutor e os demais esperavam respostas do tipo “o segredo é o amor” ou “é achar o par ideal”. Contudo, muito seguro de si, respondeu ele: “o segredo é a educação”. E depois explicou que com isso queria dizer que cada um há de tratar o outro com respeito.
E mais que com palavras, eles eram um exemplo vivo de que o trato respeitoso e afável é imprescindível para se viver juntos com harmonia, tanto que, passados os anos, eles ainda mantinham o hábito de andar de mãos dadas, ele de cuidar em que ela entrasse em sua frente, ela, por seu sua vez, cuidava de que os trajes dele estivessem sempre em ordem, que tomasse os remédios na hora certa, em suma, em seus dias, os exemplos de dedicação um ao outro faziam viva a receita que davam para o sucesso no matrimônio.
Participei há uns anos de um curso feito para casais, intitulado Expectativas e Realizações no Casamento. O tema da felicidade no matrimônio foi tratado com grande competência pelos palestrantes. Um deles, após uma brilhante abordagem sobre o assunto, concluiu que o que sustenta o matrimônio é a qualidade do tempo que se passa juntos. Marido e esposa são bem sucedidos quando olham para trás e contemplam que os momentos alegres e tristes que passaram juntos serviram para construir a solidez da família.
O diálogo é de importância fundamental. Julian Marías, filósofo espanhol, falecido na semana passada, em sua obra “La mujer y su sombra” afirma que o amor consiste muito principalmente em falar e a decadência da conversação afeta-o profundamente.

Casamento não é, como dizem, uma loteria, em que, por pura sorte, se acerta ou não. Muito mais se assemelha a um empreendimento no qual o sucesso depende da dedicação dos empreendedores. Há que se cuidar muito bem de cada momento, com atenção nas pequenas coisas. Tal como as grandes construções se fazem de pequenos tijolos, um de cada vez, a felicidade no matrimônio se constrói no dia a dia, um sorriso aqui, umas rosas de presente ali, uma mesa bem posta para esperar o outro, um abraço forte nas tribulações, de tal sorte que, quase que sem se notar, o edifício crescerá tão forte e belo que tempestade nenhuma o poderá derrubar.

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